LOADING

Type to search

Quando Paris alucina

Andrea Ribeiro
Share

Ela surgiu do nada, pedalando freneticamente uma bicicleta com cestinha. “Hey, you! Follow me!”, gritou do outro lado da rua. Nós quatro nos olhamos por alguns segundos, pegamos nossas pesadas malas (ah, viajantes inexperientes…) e saímos correndo para alcançá-la. “Follow me, follow me… quick!”

Lari, que estava de mochila (era pesada, mas a deixava mais livre), disparou na frente. Meu cunhado Marco e minha irmã Mari corriam dignamente com suas pernas longas e malonas grandes. Eu, muitíssimo acima do peso, com uma mala daquelas de tamanho médio e uma bolsa que pesava mais de 10 quilos (posso estar exagerando), suava em bicas enquanto tentava dar uma semi-corridinha. Fiquei para trás, mas com todos ao alcance da minha vista, felizmente.

Quick, I wait for you in ‘Líplêi’, go!”, gritou Madame Anh – cujo nome esqueci, porque jamais soubemos pronunciar e, por isso, a batizamos de Madame Ho Shi Min. “Líplêi?” Pensamos que diabos seria aquilo, mas logo identificamos: era uma loja “Replay”, numa rua acima. Corremos mais um pouco e chagamos ao nosso destino: um flat na rue Saint Martin, no 2º distrito. Felizes da vida, seguimos Mme. Ahn, que nos puxou – Lari e eu, com mala e tudo – para dentro de um elevador onde só caberiam duas pessoas bem pequenas. Como estávamos em três, uma das minhas pernas estava no chão e a outra em cima da mala. Acho que a Lari estava deitada por cima de mim. E madame encurralada num cantinho. Mas ok. Estávamos “em casa”.

A essa altura, estávamos (e, confesse, você também) com sérias dúvidas sobre aquele misterioso local. Felizmente, o apartamento era ótimo, embora a TV não funcionasse (o que, na verdade, não fez nenhuma falta). “Pay 500 euro now!”. Pagamos. “This is key, this is password. Ok. Bye.” E madame correu para a porta: “Mas, ei… Onde deixamos a chave quando formos embora?” “Aqui dentro. Faxineira me entrega depois. Ok.” Foi a última vez que vimos mme. Ho Shi Min, uma espécie de Mestre dos Magos oriental.

A comparação não é mais um dos meus exageros (#dramaqueen). Durante toda a negociação para o aluguel do apartamento, ela nos enviou pistas, exatamente como o personagem do desenho. Nunca uma resposta objetiva e completa. Por exemplo: não tínhamos o endereço exato do apartamento. Em um dos e-mails, madame nos pediu que, assim que chegássemos a Paris, desembarcássemos na estação Les Halles e ligássemos para ela. “É mais fácil nos dar o endereço e encontramos a sra. lá”, disse eu. “Não. Eu encontro vocês na estação e mostro como ir. É fácil. É perto”, respondeu. Por isso, quando chegamos na Cidade Luz, lá fui eu ligar para mme. Ho Shi Min. Uma experiência um tanto complexa, uma vez que não falo muito bem inglês, ela tinha um forte sotaque, e a estação estava muito barulhenta. Estaríamos condenados a ficar na cidade (ou na estação) para sempre, como os garotos da Caverna do Dragão?

No caso, não. Embora estivéssemos nos sentindo verdadeiros parisienses comprando nossas baguetes na boulangerie da rua, nossos legumes fresquinhos no mercadinho da esquina, vendo as crianças saindo da escola que ficava na frente do prédio. Mas bastava sairmos um pouco da “nossa região” e ficava bastante claro que éramos turistas. E daqueles atrapalhados.

Vocês ainda não me conhecem e não têm como saber. Mas sou muito distraída e atrapalhada. Quando estou junto com minhas irmãs, então… Segura, Berenice! Portanto, várias situações – além da incrível aparição da mme. Ahn – foram um tanto desastradas e/ou cômicas nessa Eurotrip. Quer ver?

Comecemos a aventura!

Cena 1: Estávamos no metrô. Eu em pé, com uma mochila nas costas (sim, você leu corretamente: nas costas). Não contente com essa deselegância e falta de noção, ainda sou daquelas que se mexe bastante e fala muitíssimo. Conversa vai, conversa vem, bati diversas vezes numa senhora que estava lendo seu Le Monde com minha mochilinha (que de inha não tinha nada, já que estava cheia de suprimentos e ficava, assim, meio que um casco na minha cacunda – não à toa, meus companheiros de viagem me chamavam de tartaruga ninja). A distinta senhora me xingou, por supuesto. Mas, como não sei francês, apenas sorri envergonhada e pedi “pardon”. Não adiantou, pela careta que ela me fez. Meus companheiros riram muito. Eu, não. Mas aprendi a lição: mochila só na frente ou o chão, amiguinhos!

Cena 2: Fomos fazer um passeio de barco pelo rio Sena. O dia estava frio e garoento. Mas pusemos casacos, nos enrolamos em echarpes e encaramos. Escolhemos o local para sentar e ficamos admirando as belezas daquela cidade. Por isso, não nos demos conta de que estávamos sentados ao lado da lata de lixo. Quase dentro dela, na verdade. O passeio foi lindo. Já o cheirinho… Por isso, escutem a tia Déia: escolham bem seus assentos. Afastem-se de lixeiras e banheiros pra garantir uma experiência inesquecível para todos os sentidos.

Não façam como eu, Lari e Mari: escolham bem seus assentos para garantir uma experiência completa para os sentidos

Cena 3: Tenho uma amiga que fala francês. De brincadeira, sempre que ela me diz “Merci”, eu respondo “Beaucoup”. Sempre rimos muito. Mas nem todos conhecem nossa piada interna. Você não conhece (a não ser que seja a Ju ou um de meus amigos para quem contei a historieta), imagine então uma senhora aleatória (mais uma) que entrava em uma lojinha em Giverny. Eu e Lari estávamos saindo e abri a porta. Ela agradeceu: “Merci”. O que eu respondi? Pois. Ela me olhou com cara de ponto de interrogação. Eu e Lari rimos muito.

Cena 4: Eu, Lari e nossa amiga Lindalis, que estava morando em Ruen na época, fomos visitar o Centro Pompidou depois de comer um crepe na rua – porque a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte! (desculpem, Titãs). Tudo muito bacana ali. Umas obras de arte contemporânea maravilhosas e coloridas. Não contei pra vocês, mas além de distraída e desastrosa, também tenho um impulso irrefreável de sentir as coisas. Preciso pegar, revirar, interagir. E tinha uma obra lá que, para mim, era perfeita para isso. Não lembro no nome, mas era colorida, grande, com um formato diferente. Convidou demais para que eu entrasse nela. E fiz isso, com muita alegria. Pelo menos até ouvir um “Madame! Madame! Madame!” Virei para trás e uma policial me olhava com ar reprovador. Apontou para uma placa que dizia: “Ne touche pas – Don’t touch – Não toque”. Pedi pardon e me retirei. Lari e Linda riram muito. Eu, não.

Vai por mim: não entre nas obras, por mais convidativas que sejam!

Cena final: A viagem transcorreu com algumas trapalhadas, mas nada se compara a nossa saída da cidade. Estávamos na estação de metrô, indo para o aeroporto. Com toda aquela malarada, casacos grandes, cansaço e muita história na bagagem. Eis que surge um problema: a porta do metrô era estreita. Bastante. A mochila da Lari passou. A minha mala média passou. A mala gigante da minha irmã e cunhado, não. Ficou entalada. Era o portal da Caverna do Dragão se fechando para nós, aventureiros sem poderes mágicos. Minha irmã estava empurrando a dita-cuja, tentando – em vão – que ela fosse parida por aquela porta de vidro. E a Lari tentava puxar pelo outro lado. Eu ria de nervoso. Meu cunhado, desesperado, tentava achar uma solução para evitar que uma legião de franceses apressados e irritados avançassem sobre nós. Por isso, não deu atenção a uma senhora (olha aí!) que batia em seu ombro, insistentemente. “Monsieur! Monsieur!”. E meu cunhado: “Non, madame, non!” Monsieur! Monsieur!” “Non, madame, please!”. No desespero, Mari tentou pular a mala mas acabou, ela também, entalada e trabalhada num espacate digno de nota 10. Algum tempo se passou (uma eternidade para nós) e, finalmente, a mala voou para fora. Ufa! Vitória! Os franceses começaram a passar novamente para o outro lado. Inclusive a senhorinha que, ao nos ver, apontou para uma porta ao lado da nossa. Tinha o triplo do tamanho. Rimos muito. Fim.

Isso é que é quarteto fantástico (ou aventureiros na Caverna do Dragão)

E você, tem alguma história de viagem divertida? Conta pra gente!

Mais Paris aqui no Vai para o Mundo

Se você gostou dessas histórias, dá uma olhada nas dicas de Paris desses outros textos:

Para entender Paris – uma visão geral da cidade

A Paris dos Parisienses

Tags:

You Might also Like

Leave a Comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *

%d blogueiros gostam disto: